As lições do Mestre Phil

“Não se esqueçam que uma roda não é feita apenas dos raios, mas também do espaço entre eles. Raios fortes, porém mal colocados, tornam um roda fraca. O potencial integral da roda só se manifesta se houver harmonia entre as partes. A arte de fazer rodas reside na habilidade do artesão em conceber e criar um espaço que contenha e equilibre os raios na roda”

(Mestre Chen Chen)

“Vocês vêem esta taça? – perguntou Chaa, segurando um copo. – Para mim, este vidro já está quebrado. Eu usufruo dela, eu bebo dela. Ela contém a minha água de forma admirável, algumas vezes até reflete o sol, em lindos padrões. Se eu bater de leve nela, ressoa como um bonito som. Mas quando a coloco na prateleira e o vento a derruba, ou meu cotovelo esbarra derrubando-a da mesa, ela cai no chão e se estilhaça. Então eu digo “É claro”. Quando compreendo que este copo já está quebrado, cada momento com ele se torna precioso.

(Mark Epstein)

“Quando não conseguimos aceitar a verdade da transitoriedade, abrimos a porta para o sofrimento”

(Suzuki Roshi)

“Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou. Assim, tudo é regido pela dialética, a tensão e o revezamento dos opostos. Portanto, o real é sempre fruto da mudança, ou seja, do combate entre os contrários”

(Heráclito)

“A composição do time pode ser diferente de um ano para ano, mas os princípios de não-egoísmo e compaixão, que nortearam os Bulls durante três campeonatos seguidos, sempre estarão conosco”

(Phil Jackson)

Adotei Cestas Sagradas como meu Manual de Vida.

Para quem adota a literatura esportiva como leitura, não pode deixar de ler este livro.

Estou finalizando pela 5ª vez a leitura deste livro.

E a cada vez que o leio, encontro uma nova página. É como se estivesse fazendo uma nova leitura cada vez que mergulho nas páginas deste que, para mim, tornou-se uma espécie de manual de filosofia de vida.

Phil foi treinador do maior time, do maior astro do basquete mundial, Bulls e Jordan.

A princípio, seria simples juntar todas aquelas feras, lideradas pelo maior astro, treina-los e passar como um rolo compressor sobre os adversários.

Mas não era tão simples. Phil teve que se recriar, buscar apoio na espiritualidade e na filosofia budista para conduzir seu trabalho.

Separei estes trechos porque tratam do caminho da impermanência, da verdade da transitoriedade, porque falam de mudança, como aceita-la e como conduzi-la.

Antes porém, destaquei a passagem do Mestre Chen Chen.

A “Roda de uma Bicicleta”. O que difere uma roda da outra, o que torna uma forte e a outra, menos potente.

O segredo está na colocação dos raios, da distância exata entre eles, não basta ser forte, os raios devem ser colocados numa distância harmônica de forma que a roda tenha o perfeito equilíbrio.

O equilíbrio da roda vem da força dos raios e da distância que eles são colocados.

O princípio da impermanência, “Não se pode entrar no rio duas vezes”, “E a taça, por mais linda que seja, na estante, mesmo que intacta, já esta quebrada”.

Tite não entendeu estes princípios.

Pelo contrário, subjugou-os.

Acreditou que a taça, mesmo linda, produzindo um belo som, porém na estante, seria capaz de proporcionar o mesmo prazer cada vez que dela fosse usada para nela beber água.

Imaginou que seria possível manter a maioria dos raios de uma roda para uma nova corrida, que estes raios suportariam os solavancos, os buracos e as pedras no caminho, continuamente.

E por último, além de mexer pouco na composição do time, de até ser reticente para proceder estas mudanças, acreditou que mudando um pouco o princípio tático do time, continuaria o tornando vitorioso.

Um dos primeiros times de futebol a utilizar os princípios de não-egoísmo e compaixão foi o Barcelona.

Princípio que nada mais é que não importa a sua função no time, se você é juvenil ou a maior estrela, se joga no ataque ou na defesa, você participa do jogo onde ele estiver acontecendo, esteja você com a bola ou não, com a mesma intensidade e foco.

O Corinthians de 2012 era exatamente isto. “Sem a bola, todos marcam”, dizia nosso treinador. Ai surgiu a tão falada e elogiada “consistência defensiva” que tornou nossa meta quase intransponível.

Mas nesta temporada, o princípio não foi totalmente abandonado, mas digamos, “adaptado”.

E mal adaptado. Perdemos um pouco da consistência, as velhas peças, “os velhos raios” perderam a força e mal colocados, comprometeram o “equilíbrio da roda”.

Vencemos o Paulista, vencemos a Recopa. Mas o objetivo era a “Libertadores, 2013 e 2014”.

Vencer uma e garantir-se na disputa da outra.

Nossa diretoria não adotou a obsessão pelas conquistas, até porque ser obsessivo pela vitória gera estresse e desgaste desnecessário, mas afrouxou demais a corda, permitiu que o relaxamento tomasse conta.

Tite é um grande treinador. Não se discute isso. Mas para continuar sua carreira, precisa rever conceitos e temos certeza que fará isso.

Mudar não significa jogar fora o que foi feito de certo. E quando se vence um jogo, um campeonato, curte-se o momento, vibra-se, mas logo em seguida, inicia-se o planejamento de uma nova trajetória de forma que seja vitoriosa.

As conquistas, as taças, vão para a estante. E lá devem ser contempladas. Não se vive delas, elas já fazem parte da história, estão lá, materializadas na nossa memória.

Mas é preciso continuar olhando para a frente. Estipular novas metas, buscar novos desafios, reinventar-se, redescobrir-se, criar, inovar, mudar. Simplesmente mudar.

E além disso tudo, saber o momento de iniciar um novo ciclo, em novos ares. Tite ainda não aprendeu isso.

Todas as suas últimas saídas de clube são cercadas de momentos tensos. Não precisa ser assim. Não precisava ser assim.

Tite vai ficar na nossa memória, a ele agradecemos por tudo.

A imagem que vou guardar de Tite não foi um campeonato, nem um troféu levantado. Foi um abraço e um beijo que ele deu numa criança na sua chegada ao Pacaembu. Nunca havia visto isto num treinador. Chegam sempre tensos, focados, alguns mal humorados, mas Tite sempre chega sorridente e mesmo apressado, atende a todos.

As críticas sempre foram pontuais, ao trabalho, jamais ao ser humano. Que merece respeito e todas as homenagens do torcedor.

Um dia ele voltará e espero, renovado. Consciente de que raios fortes e bem colocados dão mais equilíbrio a uma roda, tornando-a vitoriosa, mas que precisa ser renovada a cada etapa, o raio forte de hoje não conseguirá proporcionar o mesmo equilíbrio amanhã, os percalços são muitos e desgastam as peças.

A vida vai seguir, sob novo comando.

E não basta trocar o treinador. É preciso implantar uma nova filosofia de trabalho, com novas peças, recolocando o Corinthians no caminho das vitória.

Obrigado, Tite.

E que venha, se realmente confirmadas as especulações, Mano Menezes.